O tempo passou, e veio acoplada essa visão mais “matizada” do feminismo. Ela nos disse para prestarmos atenção à nossa linguagem de mulheres como vítimas. Mais mulheres foram para escolas profissionais e de graduação, tornarnaram-se “mais inteligentes”, foram recebidas no tribunal, foram para a academia, e se tornaram especialistas em indispostos tipos de campos. Elas compartilharam do poder que os deuses masculinos tinham criado e “viram que isso era bom”. Elas começaram a dizer coisas como “… Um grande cuidado necessita ser tomado para não retratar mulheres como incapazes de decisões responsáveis” (Andrews, 1987: 46).
Algumas mulheres acreditaram serem estas palavras familiares, que elas haviam as ouvido antes, mas as analistas do discurso feminista não pareciam particularmente interessadas em registrar o retorno ao que as feministas “antiquadas” classificaram como o discurso liberal patriarcal. Elas disseram que isso era chato e fora de moda e, além do mais, as mulheres já ouviram o suficiente disso, e era depressivo. Não vamos ser simplistas e culpar os homens, elas disseram, uma vez que essa análise “oferece tão poucos pontos de alavancagem para a ação, tão poucos pontos de entrada imaginativos por visões de mudança” (Snitow e outro/as, 1983: 30)."
(...)
"Com a “vinda da idade” desta onda particular do feminismo, nós temos visto um deslocamento do radicalismo feminista ao liberalismo feminista. Esse liberalismo feminista é tanto causa quanto efeito da chamada pró-pornografia feminista e dos movimentos libertários sexuais feministas. O liberalismo sexual que tem vindo a ser definido como “feminismo”, nós estamos agora testemunhando novamente na esfera reprodutiva. Existem várias comparações que podem ser feitas entre liberais sexuais e reprodutivos, especialmente em suas reinvindicações da pornografia e das novas tecnologias reprodutivas. Eu quero iluminar uma dessas comparações aqui, especificamente como ambos os grupos utilizam a retórica do “direito à escolha” da mulher. Ambos liberais sexuais e reprodutivos têm investido em um antigo discurso liberal sobre a escolha com um conteúdo novo e supostamente feminista. Os liberais sexuais estão inconfortáveis em focar as mulheres como objetos e vítimas da supremacia masculina. Eles invocam uma linguagem de ir “além” das maneiras nas quais os homens objetificam, exploram e vitimizam mulheres (não a qualquer realidade de como mulheres sobrevivem por causa de suas ligações com outras mulheres, no entanto). Eles teriam-nos a tomar um “grande passo a frente” nas formas pelas quais as mulheres são agentes de, por exemplo, seus status na pornografia ou seus papéis enquanto representantes de reprodução. Raciocinando que porque as mulheres escolhem a pornografia ou a maternidade por substituição, eles argumentam que as mulheres precisam dessas “escolhas” para serem livres."
Janice Raymond, Liberalismo Sexual e Reprodutivo
Para ler o texto todo traduzido, clique em http://delivreacesso.wordpress.com/2012/02/06/liberalismo-sexual-e-reprodutivo/
Acho um bom texto para pensar a história de "agência" que agora, pelo que parece, está de moda nos escritos acadêmicos, e principalmente no feminismo de 3a onda e em nossas práticas.
Acho um bom texto para pensar a história de "agência" que agora, pelo que parece, está de moda nos escritos acadêmicos, e principalmente no feminismo de 3a onda e em nossas práticas.
Chego a pensar que o único feminismo que pode existir no capitalismo é aquele mais próximo da utopia "democrática" capitalista-liberal, onde tudo que fazemos é escolha e responsabilidade individual, liberdades aqui lidas como "consumo" pessoal. Neste sentido, propostas supostamente alternativas ou que até mesmo se reivindicam "radicais" como o queer, são facilmente assimiladas.
O problema é que, esse poder de definição da realidade descansa num privilégio de classe... quem define a realidade feminista de agora assim são feministas brancas e de classe média. Quem não tem privilégio de classe e cor não se privilegia tanto dessa história de agência. Privilegia quem está inserido neste capitalismo contemporâneo "democrático", e que pode consumir sua liberdade de mercado, exercer suas identidades privadas, etc. Mesmo assim coletivamente, qualquer um@ pode pensar que essa história beneficia a tod@s. Afinal o trabalhador não é coagido por algumas pressões institucionais e discursivas, a pensar que é explorado pelo patrão porque escolheu e que essa relação é igual, e que as classes sociais existem porque algumas pessoas simplesmente possuem mais dinheiro que você e isso é aceitável?
O problema é que, esse poder de definição da realidade descansa num privilégio de classe... quem define a realidade feminista de agora assim são feministas brancas e de classe média. Quem não tem privilégio de classe e cor não se privilegia tanto dessa história de agência. Privilegia quem está inserido neste capitalismo contemporâneo "democrático", e que pode consumir sua liberdade de mercado, exercer suas identidades privadas, etc. Mesmo assim coletivamente, qualquer um@ pode pensar que essa história beneficia a tod@s. Afinal o trabalhador não é coagido por algumas pressões institucionais e discursivas, a pensar que é explorado pelo patrão porque escolheu e que essa relação é igual, e que as classes sociais existem porque algumas pessoas simplesmente possuem mais dinheiro que você e isso é aceitável?
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